Neste quinto domingo do tempo quaresmal, a Palavra de Deus nos alcança como sopro novo, como água que brota no deserto da existência, como luz que nos faz ver além das dores e tropeços do passado. O Senhor nos convida a levantar os olhos e abrir o coração, para contemplar com fé as maravilhas que Ele já está realizando.
O profeta Isaías nos recorda o grande feito de Deus no passado: Ele abriu o mar de juncos para que o povo passasse rumo à liberdade, fez perecer o exército opressor no fundo das águas e conduziu seus escolhidos por uma peregrinação libertadora até a terra prometida. Mas, logo em seguida, o Senhor nos diz algo surpreendente: “Não relembreis coisas passadas, não olheis para fatos antigos. Eis que eu farei coisas novas, e que já estão surgindo: acaso não as reconheceis?”
Caríssimos, nosso Deus não é um Deus que vive do passado, ainda que nele tenha manifestado seu poder e sua glória. Ele é o Deus do agora, que continua a agir no presente. Por isso, não caiamos na tentação de ruminar memórias dolorosas ou carregar por muito tempo os pesos daquilo que não podemos mais mudar. O Senhor quer fazer brotar água viva em nossos desertos, quer abrir estradas onde só enxergamos impossibilidades. Até os dragões e os avestruzes – símbolos de criaturas selvagens e arredias, habitantes de terras inóspitas – glorificarão ao Senhor porque até nelas Ele faz brotar vida. Essa imagem poética nos fala de um Deus que transforma os lugares mais áridos em fontes de esperança.
O Apóstolo São Paulo, em sua carta aos Filipenses, nos ajuda a compreender como viver essa novidade de Deus: “Considero tudo como perda diante da vantagem suprema que consiste em conhecer a Cristo Jesus, meu Senhor”. O Apóstolo não se apega a méritos ou títulos; tudo ele considera como “lixo”, diante da graça que lhe foi dada: conhecer a Cristo, experimentar a força de sua ressurreição, ser configurado com Ele na cruz. É isso que o move a correr, a olhar para frente, a não permanecer escravo das feridas e quedas do passado, mas a avançar, iluminado pela graça.
E nós, temos corrido com os olhos fixos em Cristo ou permanecemos estagnados nos tropeços de outrora? Temos caminhado em direção à meta, ou nos distraímos com o que nos impede de viver plenamente o amor do Senhor? A Quaresma é esse tempo propício de purificação, de conversão, de renascimento interior. Precisamos reconhecer o que nos prende ao homem velho, desapegar-nos de tudo o que nos distancia do Reino e abraçar com decisão a novidade da fé.
O Evangelho deste domingo nos oferece uma das cenas mais belas do amor de Cristo: a mulher adúltera, arrastada diante de Jesus, envergonhada e ameaçada de morte. Os fariseus querem apedrejá-la. Não por zelo pela lei, mas para testar Jesus. Se Ele mandasse que não a apedrejassem, seria acusado de desprezar a Lei de Moisés. Se mandasse que a matassem, pareceria contradizer seu próprio ensinamento de misericórdia.
Mas o Senhor, com divina sabedoria, não responde de imediato. Inclina-se, escreve no chão… e depois ergue-se com uma sentença que ecoa pela eternidade: “Quem não tiver pecado, atire a primeira pedra.” Um a um, todos se retiram. A começar pelos mais velhos. E, como bem disse Santo Agostinho: “Restaram apenas dois: a miséria e a misericórdia”[¹].
Jesus, o Justo Juiz, que poderia condenar, escolhe perdoar: “Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou? […] Eu também não te condeno. Vai, e de agora em diante, não peques mais.”
Aquela mulher encontrou em Jesus um novo começo. Ela, que foi pega em flagrante, é acolhida com compaixão e enviada com esperança. Ela é a imagem da humanidade, marcada por seus erros, mas ainda assim amada, ainda assim chamada à conversão. O Senhor não nega o pecado, mas aponta um caminho novo. Ele a reergue do chão da humilhação e a coloca em pé, com dignidade restaurada.
Quantas vezes também nós fomos levantados pela misericórdia de Deus! Quantos de nossos pecados foram apagados no silêncio do confessionário, onde ouvimos do próprio Cristo a palavra da reconciliação: “Eu te absolvo”!
Fico profundamente feliz ao saber que tantos irmãos e irmãs em nossa Arquidiocese puderam fazer a experiência da misericórdia na última semana, por meio da Celebração Penitencial. Que graça imensa! Que beleza ver o povo de Deus se aproximando com fé do Sacramento da Reconciliação, para acolher a vida nova que vem do Ressuscitado.
Filhinhos, o tempo é agora. O Senhor nos chama a viver de forma nova. Não permaneçamos presos ao passado, nem sejamos juízes dos pecados alheios. Antes, façamos um profundo exame de consciência. Em vez de apedrejar, estendamos a mão. Em vez de condenar, rezemos pelos que erram. Todos pecamos, mas todos também podemos experimentar o perdão.
Jamais esqueçamos que o Senhor caminha conosco. Ele abre caminhos no deserto da nossa alma, faz brotar rios de graça onde só havia secura. Jesus não apenas nos perdoa, mas nos envia com um novo coração. Ouçamos sua voz que nos diz: “Vai, e de agora em diante, não peques mais.”
Com confiança e humildade, abramos o coração à sua misericórdia. Corramos, como São Paulo, olhando para frente. Caminhemos, como o povo de Israel, deixando o Egito para trás. E sejamos como aquela mulher, que se levantou do chão e pôde recomeçar.
Que o Senhor, cheio de compaixão, nos abençoe com sua paz e renove nossa vida com seu amor.
Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!
